Era Semana Santa do ano de 1985, eu e minha família tínhamos ido passar o feriado na casa que tínhamos num condomínio na cidade de Teresópolis, perto do Rio de Janeiro. Eu adorava ir lá até porque tinha um grupo, jovem super animado, eu tinha 13 anos na época e fiz amigos tão incríveis que estão na minha vida até hoje.
Foram muitas as memórias maravilhosas que tive em Terê, mas naquele feriado eu lembro, como se fosse hoje, um dos NÃOS mais impactantes que ouvi da minha mãe.
No sábado à noite, a galera animou e ia para a boate da cidade, ficava num clube chamado Higino. Um pai ia levar e o outro buscar. Algumas amigas eram de fato uns dois ou três anos mais velhas que eu, e outras da minha idade. Obviamente eu queria ir com o pessoal seria a minha primeira vez numa boate “de adultos”.
Mamãe disse um sonoro NÃO. Você não tem idade suficiente para frequentar este ambiente ainda, você não está preparada, e não é saudável você com 13 anos ficar até altas horas da madrugada na rua. Eu nem preciso dizer para vocês que pirei, né?! Argumentei que todo mundo ia, que a mãe de todo mundo tinha deixado, e ela: não sou mãe de todo mundo, você não vai.
Chorei, me revoltei, fiquei de mal humor, fiz malcriação, chamei a minha mãe de caretona, lógico. E ela firme na sua decisão não voltou atrás. Eu não fui a tal boate e me tranquei no quarto, com depressão por peder o programa e com vergonha, porque como eu ia falar pros meus amigos que a minha mãe não tinha deixado eu ir, que coisa mais brega, eu pensava. Mas tive que falar a verdade pra galera, porque mamãe não tinha deixado mesmo e nem tinha como (e nem porque na verdade) inventar desculpas. Sim, a minha vida era miserável.
Mas assim como o NÃO, outra coisa que me marcou naquele dia foi que a minha mãe me disse: “você vai ter oportunidade de ir a todas as boates do mundo, tudo tem seu tempo e você vai aproveitar muito mais fazendo as coisas na hora certa.”
Trinta anos se passaram daquele dia e ontem mesmo eu me peguei falando com umas amigas como eu aproveitei a minha vida e que aos 43 eu não vou à boate mais, porque cansei. Minha mãe tinha razão, quando fiz 18 anos ela finalmente deixou eu começar a frequentar as “nights”. Recuperei “o tempo perdido” e conheci todas as boates do Rio de Janeiro, e também de São Paulo, fiz muita balada nos nightclubs de Nova York, Miami, Los Angeles, Paris, Londres e até de Jerusalém, em Israel.
Vi o sol nascer muitas vezes depois das baladas, passei noites nos botecos cariocas falando da vida, fui a festas pirantes em NY. Ah, e sem dúvidas perdi a conta da quantidade de vezes que fui à boate do Higino em Teresópolis, o foco de toda a dor naquela semana santa, depois de alguns anos virou até programa tão batido, que eu não queria ir mais, “melhor ficar no condomínio batendo papo”, a gente dizia.
À medida que o tempo passava, e eu amadurecia, eu concordava mais e mais com a minha mãe. (hoje em dia eu concordo 100% com ela), não é necessário mesmo uma criança de 13 anos frequentar uma boate e voltar pra casa com o dia amanhecendo. O seu corpo ainda não está preparado pra noites longas, pro álcool e sua cabeça não está pronta pra enfrentar a energia da madrugada mesmo. Talvez por isso, a entrada seja permitida mesmo só para maiores de 18 anos (nos EUA é 21). E eu encaretei (ou amadureci mesmo) que eu acho um absurdo hoje a lei não ser respeitada no Brasil e algumas boates permitirem a entrada de menores ainda.
Minha mãe nunca teve problema em nos dizer não, quando achava que era pertinente, sem exageros, a gente sempre pôde fazer um monte de coisas, mas tínhamos alguns limites.
E eu acho que foi isso que me deu a capacidade de respeitar as pessoas. Seja o professor, o chefe, até um amigo. E isso me tornou uma pessoa mais determinada porque eu nunca achei que o universo tinha obrigação de me dar tudo de mão beijada, pelo contrário, temos que correr atrás mesmo de cada uma das nossas conquistas.
Mas a maior lição que aprendi com os “nãos” da minha mãe foi a lidar com os “nãos” que a própria vida me dá. Sem ficar reclamando, sem ficar frustrada, muito pelo contrário, eu acho que o não eu sempre tenho, o sim vem só às vezes, mas quando ele vem é transformador.
Acredito que este é o tipo de lição que aprendemos em casa, na infância, e eu só agradeço a minha mãe por tê-las me ensinado porque isso faz toda a diferença na minha vida. Eu acho que sou muito mais segura e independente emocionalmente por ter aprendido desde cedo a lidar com as limitações que a própria realidade vai te impor. Mamãe me ensinou a aproveitar e valorizar as oportunidades na hora que elas surgem, reclamar menos, batalhar mais, e vibrar com cada conquista.
O mais engraçado é que a minha festa de aniversário de 18 anos foi numa boate badalada no Rio de Janeiro na época, chamada Pappillon, que ficava dentro do Hotel Inter-Continental em São Conrado, aos 21 anos comemorei meu aniversário na boate Press, na Barra da Tijuca. Aos 35, foi no Zero Zero, na Gávea. E todas essas festas épicas eu ganhei de presente dos meus pais.
E eu nunca vou esquecer o dia que mamãe foi comigo a Limelight, uma boate que ficava dentro de uma Igreja em NY. Uma das nights mais badaladas e loucas do mundo nos anos 90. Nesta época eu já tinha uns 24 anos, já era “rata” de boate e não era mais “mico” sair com a minha mãe, muito pelo contrário, foi prazeroso vê-la lá. Alias, é um prazer lembrar deste dia até hoje.
Infelizmente, as fotos desta viagem estão no Brasil e eu não queria pedir a mamãe que me mandasse para não estragar a surpresa, por isso este post está ilustrado com as fotos de nossa última viagem a Atlanta, Savannah (Geórgia) e Willmington (North Carolina), em agosto do ano passado. A Limelight fechou e virou shopping, para a minha tristeza e de todos os nova-iorquinos. Mas vai a fotinho atual do local, pra lembrar a night que eu fiz com a pessoa que me ensinou que tudo tinha a sua hora, e tem mesmo, e que aproveitar as coisas no tempo certo torna elas inesquecíveis.
Não foi o “não” que ficou de lição daquela Semana Santa de 1985, mas o valor do sim.
Obrigada mamãe por não ter banalizado o sim, ter se mantido firme e forte nas suas decisões que ensinaram a gente e lidar com os inúmeros desafios da vida adulta.
Feliz dia pra você e para as mamães de todos os nossos protagonistas, leitores, colaboradores. Feliz dia para você que está lendo este texto e mãe. Eu não tive coragem de brincar disso, porque acho que a maternidade não é mesmo para todo mundo, mas admiro muito vocês mães e sinto um amor e uma gratidão profunda pela minha mãe.