Fiquei radiante ao saber que um dos nossos trabalhos na aula da “Arte da Entrevista” no curso de Jornalismo da UCLA seria entrevistar o produtor e diretor de TV, Alan Poul.
É sempre ótimo ter a oportunidade de conversar com uma pessoa bem-sucedida em Hollywood. Alan produziu e dirigiu séries épicas como “Six Feet Under” e “The Newsroom”, além disso tem uma ligação forte com o Brasil. Amigo da cineasta brasileira Monique Gardenberg, foi um dos produtores de seu filme Jenipapo (1996), fala português e já visitou diversas vezes nosso país.
Vocês podem imaginar que assunto para a entrevista com Alan não falta, mas eu só tinha 8 minutos de papo e precisava focar em um tópico, que foi facilmente decidido na pesquisa prévia que fiz sobre sua carreira. Alan Poul produziu uma das minhas séries prediletas, “Minha Vida de Cão” (“My So Called Life”), que é também considerada um clássico da TV norte-americana.
O seriado estrelado por Claire Danes e Jared Leto foi ao ar 20 anos atrás e teve apenas 19 episódios. Muitos podem me chamar de louca, com tanto assunto para abordar na entrevista com Alan, por que justamente uma série que foi cancelada na primeira temporada em 1994? Os fiéis e devotos fãs de “My So Called Life” por outro lado vão aplaudir a minha decisão, afinal a gente não perde a chance de celebrar esta obra-prima, ainda mais com uma pessoa que fez parte dos bastidores desta história.
Abertura
O próprio elenco até hoje se reúne para comemorar o show. Premiada com Emmy e o Golden Globes (por sua atuação em “My So Called” e “Homeland”), Claire Danes conto ao entrevistador Jimmy Fallon que fez um churrasco na casa dos seus pais em LA para festejar os 20 anos de “Minha Vida de Cão” e complementa dizendo que Winnie Holzman, a criadora da série, e até hoje sua amiga íntima. Confiram:
Claire Danes – “Minha Vida de Cão”
Aliás no nosso papo, Alan diz que não se surpreende com o fato da série continuar sendo badalada até hoje, apesar de achar interessante me ver chegar com o box de “My So Called Life” e dizer que aquele seria o tópico da nossa entrevista na aula. “Eu não sabia que o seriado era tão famoso no Brasil, tínhamos plena consciência da popularidade nos EUA, mas na era pré-internet era mais difícil sabermos a real resposta no exterior. Mas é ótimo voltar a este momento da minha carreira. Na verdade, eu entrei para o time no episódio 7 já, um outro produtor saiu e me chamaram. Foi um privilégio, mas o mérito é mesmo de Winnie Holzman, que idealizou o seriado. A voz da protagonista Angela Chase era dela. Winnie falava com o coração sobre todos os medos, angústias, alegrias da adolescente que um dia ela mesma foi. Por isso o público se identificava tanto, era real”, fala Alan.
Clipe da série
“Então por que foi cancelada tão prematuramente?”, eu pergunto quase em desespero para Alan. Ele sorri da minha revolta ao responder: “A ABC (emissora de TV que transmitia a série) adorava o show e nós – equipe, escritores e elenco – também amávamos, a audiência era boa e refletia o quanto a série era querida pelo publico também, mas os anunciantes não gostavam e nós dependíamos deles para que o seriado continuasse. “My So Called Life” era muito a frente de seu tempo, tinha um personagem gay que usava maquiagem e um professor homossexual que morava com seu parceiro, esses assuntos não eram abordados na TV aberta no início dos anos 90, era demais para a cabeça dos patrocinadores e por isso tivemos que encerrar a primeira temporada no episódio 19″.
“Saiu do ar e entrou para a história do entretenimento”, eu falei. E Poul concordou e confessa” como produtor de seriados é claro que sempre que começamos um trabalho a gente torce para dar certo e durar pelo menos 6 temporadas. Por outro lado, acho que foi até bom “My So Called Life” ter poucos episódios, pois todos são ótimos e memoráveis, quando um show fica no ar muito tempo, nem sempre a qualidade continua a mesma”.
Eu sorri, mas discordei do meu gentil entrevistado, eu preferiria ter vivido 1 década com Angela Chase e Jordan Catalano. Alan viu minha reação e compreende: “para um fã, uma série pode ter episódios mais fracos, não é? O que importa é durar anos e ele nunca enjoa mesmo”, ele fala sorrindo.
E eu não poderia encerrar a entrevista sem perguntar a Poul quais os segredos dos bastidores do show ele revelaria pra gente: “como produtores de TV nosso trabalho é escrever os episódios, e nós nos divertíamos muito no “writer’s room” (sala dos escritores) traçando o destino dos personagens, que particularmente nós todos nos apegamos bastante. Apesar da história se passar na Costa Leste dos EUA (no estado da Pensilvania), a série era gravada em LA, então era sempre um desafio pro elenco usar roupas de frio quando aqui estava sol e a temperatura era de 30 graus e, como a maioria do nosso elenco era adolescente na época, nós não podíamos gravar até muito tarde (de acordo com as regras do sindicato dos atores nos EUA, menores de idade só podem gravar um determinado número de horas por dia), então era uma loucura coordenar os horários, especialmente da Claire (Danes, interprete de Angela Chase) que estava praticamente em todas as cenas de todos os episódios, pois sua personagem narrava a história. Mas, sem dúvidas foi uma experiência marcante não só para o elenco, como para todos os envolvidos. Inesquecível”.
Sim Alan, “Minha Vida de Cão” marcou a nossa história e até hoje muitos adolescentes, seja por influência de seus pais, ou por serem fãs de Jared Leto e Claire Danes, assistem e vibram com a série como aconteceu com minha geração há 20 anos.
O simpático Alan Poul adorou saber disso e agradeceu o tema do bate-papo, “bom relembrar os momentos bacanas da nossa trajetória profissional e, sem dúvidas para mim, este foi um deles”. E assim encerramos o que era para ser um trabalho da pós-graduação mas, na realidade, foi uma prazerosa conversa e um sonho realizado, conhecer alguém que contribuiu para esta história que, apesar de ter durado pouco tempo, marcou a minha vida pra sempre.
E se você ainda não assistiu a série e precisa de mais detalhes sobre o show, não deixe de conferir as matérias que já fizemos sobre “My So Called Life”. Tenho quase certeza que você vai ver o piloto sem mesmo terminar de ler a matéria e ouvir o podcast e, melhor, que não vai se arrepender: