O musical “Hamilton” revolucionou a Broadway e a forma de contar a história dos EUA, trazendo para os palcos o hip-hop, jazz e R&B com um elenco marcado pela diversidade, que representa os fundadores dessa nação. Escrito pelo talentoso Lin-Manuel Miranda, o musical conta a história dos Estados Unidos por vozes estadunidenses, trata de temas como escravidão e imigração através da jornada do primeiro secretário do Tesouro, braço direito do presidente George Washington, Alexander Hamilton.
“Hamilton”, aclamado pela crítica e pelo público, bateu recorde de bilheteria, foi o álbum mais vendido da história da Broadway e foi o espetáculo que mais recebeu indicações ao Tony Awards até hoje. Quando estreou no The Richard Rodgers Theatre, em julho de 2015, os ingressos, que chegavam a custar mais de mil dólares, esgotavam tão rápido que eram também disponibilizados em uma loteria.
Depois de quase sete anos, eu finalmente consegui um ingresso com um preço mais razoável (paguei US$ 293 por um lugar bacana, ainda assim tenho consciência que é caro, especialmente em reais, aproximadamente R$ 1400).
Mas valeu a pena cada centavo. Mesmo não tendo tido a oportunidade de assistir com o elenco original, quando o próprio Lin interpretava o protagonista Hamilton, o espetáculo é realmente revolucionário, não só em relação ao gênero musical, como na genialidade de Lin em colocar atores latinos, nativos e pretos para interpretarem personagens da história que eram brancos, lembrando que o homem branco durante décadas pintava o rosto para interpretar personagens pretos e nativos no cinema.
Como mencionou em diversas entrevistas, Lin queria celebrar as minorias que, de fato, construíram esse país, e a trilha sonoro (rap, hi-hop) também representa as minorias que são, frequentemente, esquecidas nos livros da história.
Saído do sucesso de seu musical “In The Heights”, que conta a história do bairro Washington Heights, em NY, a comunidade latina onde Lin cresceu – Miranda teve a ideia de fazer uma musical sobre Alexander Hamilton, ao ler sua biografia. Em 2009, ele foi convidado pelo então presidente Barack Obama e pela primeira-dama, Michelle Obama, para uma apresentação da primeira noite de música e poesia na Casa Branca.
Nessa noite, Lin comentou que estava trabalhando num álbum de hip-hop (isso ainda antes do musical) e que acreditava que Alexander Hamilton era a personificação do gênero hip-hop. Arrancou gargalhadas da plateia, até porque até então ninguém associava Hamilton ao hip-hop, era uma ideia surreal demais pros livros de história dos EUA. Lin entendeu a surpresa e explicou, “Hamilton foi um filho bastardo (seus pais não eram casados quando ele nasceu), imigrante, pobre, que se tornou o braço direito de George Washington e secretário do Tesouro, responsável por cuidar do dinheiro dessa nação. Ele tretou com todas as pessoas do governo e fez isso tudo através das suas palavras. Hamilton simboliza o que é fazer a diferença e conquistar o sucesso e dinheiro através das palavras (que é a característica do hip-hop)”.
Na sequência do discurso, Lin-Manuel canta a primeira música do álbum, que hoje é o número de abertura do espetáculo, interpretando o vice-presidente Aaron Burr, o homem que matou Alexander Hamilton.
Vale a pena assistir essa apresentação histórica na Casa Branca, em 2009, no primeiro mandato do governo Obama.
Em 2016, último ano do segundo mandato de Obama, e depois que Hamilton já tinha se tornado um fenômeno, o presidente e a primeira-dama, Michelle, que como ela mesma disse era fã de carteirinha e devota do espetáculo, receberam todo do o elenco de “Hamilton” novamente na Casa Branca.
Michelle organizou um workshop com Lin e atores do espetáculo para alunos de diferentes high schools do país. Eles tiveram a oportunidade de conhecer e fazer perguntas a Lin e alguns integrantes do elenco. Na sequência o próprio Barack apresenta o elenco que fez uma apresentação especial do espetáculo. Nas palavras de Obama “Que presente maravilhoso essas pessoas (o elenco de Hamilton) deram para os Estados Unidos da América. É raro quando uma peça artística nos lembra o que há de melhor em nós mesmos, e isso que essas pessoas fizeram.”
Hamilton tem montagens pelos EUA e mundo afora, inclusive promove sessões especiais para estudantes que incluem Q&As e a produção distribui material didático como uma forma divertida e, segundo Michelle Obama, “certa” de aprender história.
Hoje, eu sou 1 entre as milhões de pessoas que assistiram o espetáculo ao longo dos anos. Cheguei com grandes expectativas ao teatro, saí emocionada, inspirada e, mais importante, representada. Como Hamilton e a família de Lin-Manuel, eu sou imigrante nos EUA e tem uma frase simples de uma das músicas (entre tantas frases e versos e verdades ditas em todas as canções do espetáculo) que é a minha voz nesse país: “São os Imigrantes que fazem as coisas acontecerem nos EUA”.
Essa verdade, repetida e assistida por muita gente que nunca tinha ido a Broadway antes, pessoas de todas as nacionalidades, todas as cores e crenças, serve como lembrete da grande verdade sobre essa nação, apesar de muitos estadunidenses lutarem contra os imigrantes, somos nós que sustentamos essa economia desde o início dos tempos.
“Hamilton” é a melhor aula de história que você pode ter na vida e, acredite, talvez seja a primeira vez que você chore ou gargalhe ou se emocione ao som de um rap, mas será inesquecível. As cortinas do teatro fecham, mas você leva “Hamilton” com você pra onde for. Pra sempre.
“Hamilton” ainda está em cartaz, saiba mais sobre o musical e sobre a compra de ingressos no site oficial:
E, se você não pode assistir uma montagem teatral, veja o filme “Hamilton”, estrelado pelo elenco original, que está disponível no canal Disney+:
Ouça a trilha sonora oficial, o álbum mais vendido da história da Broadway, também com o elenco original: