Em entrevista, criadora de “Good Trouble” fala sobre a importância das mensagens das séries

Joanna Johnson, umas das criadoras e produtora executiva da série “Good Trouble”, spinoff the “The Fosters”, ouviu minha conversa com a atriz Maia Mitchell sobre o Brasil, e quando sentou à mesa para a nossa entrevista no ATX Festival, em Austin, me disse que nunca tinha visitado o nosso país. “Nunca fui ao Brasil, mas tenho muita vontade de conhecer”, disse Joanna. “É um país muito bonito”, afirmei. Ela sorridente e simpática respondeu: “não tenho dúvidas”. Um colega jornalista acrescentou: “é um pouco mais úmido que Austin, mas eu conheço e adorei”.

Joanna, que é natural do Arizona, estado conhecido pelo seu deserto e pelas altas temperaturas no verão, confessou: “engraçado que eu nasci e cresci no Arizona, que faz um calor gigantesco, mas eu não gosto do verão não, tenho que ir ao Brasil na primavera ou no outono”. Eu concordei acrescentando que apesar de ser do Rio de Janeiro também não sou fã de calor.

E neste clima pra lá de descontraído, começamos nosso bate-papo no qual Joanna revelou a importância de abordar assuntos relevantes em “Good Trouble”, especialmente quando se escreve para jovens, público-alvo do canal Freeform, onde o seriado é exibido. “Um dos motivos pelos quais eu escolhi ser roteirista foi ter a chance de tocar corações e almas. Eu não comecei a trabalhar na indústria com o propósito de participar de projetos que só entretem, mas sempre escolhi fazer parte de projetos que tivessem mensagens educativas. Sempre acreditei que se influenciasse positivamente 1 pessoa, o meu trabalho teria valido a pena. Eu lembro que em ‘The Fosters” (Joanna era roteirista, produtora e dirigiu vários episódios do seriado), as pessoas escreviam pra gente dizendo que não conheciam pessoas gays antes de começarem a assistir a série. Alguns inclusive nos disseram que achavam que um casal gay não deveria adotar crianças, e que mudaram de opinião depois do seriado. E recebemos várias mensagens sobre outros assuntos também, várias nos agradecendo por falar de imigração. Isso tudo foi muito gratificante e é a maior compensação do meu trabalho. Por isso, e tão importante pra gente focar em temas atuais e importantes em “Good Trouble” também.”

A segunda metade da primeira temporada estreou semana passada e, enquanto aguardamos ansiosos o segundo episódio que vai ao ar hoje à noite, revelamos algumas aventuras e estórias que os roteiristas planejam abordar nessa etapa da série, que já foi renovada para a segunda temporada que irá ao ar ano que vem.

Callie e Mariana são personagens que desafiam o ambiente profissional em que elas se encontram. O que podemos esperar do futuro delas?

Joanna: Tanto Callie quanto Mariana são lutadoras, elas não se conformam com o “status quo”, elas questionam e gostam de abalar as estruturas, provocar mudanças positivas. A Callie sabia que ia criar confusão quando foi trabalhar com um juiz conservador, todo mundo que conhece a Callie bem (desde “The Fosters”) sabe que não era uma boa ideia, que ela ia acabar causando problemas para si mesma (a personagem é super liberal, especialmente em relação as suas convicções políticas). Então todo mundo sabia que ela se frustaria naquele ambiente, o que é uma excelente estória dramática para a personagem e para a nossa série. Com isso, a gente sabe que o fato da Callie ter confrontado Wilson (o juiz, seu chefe) colocou o emprego dela na reta.

Já a Mariana, ela terá que tomar uma decisão, se ela quer realmente continuar na “Speculate”, apesar do abismo salarial entre mulheres e homens e de todo o bullying que as mulheres sofrem na empresa, a fim de dar continuidade ao projeto que foi uma ideia sua, mas que ela teria que abrir mão se saísse de lá. O ambiente de trabalho da Mariana é muito tóxico para ela, que apesar de ser forte e querer mudar a realidade, ela sabe que não vai acontecer da noite para o dia, vai levar tempo, então ela terá que ser mais persistente do que nunca para vencer as barreiras e alcançar seus objetivos profissionais”.

As protagonistas de “Good Trouble” Cierra Ramirez e Maia Mitchell com Joanna Johnson, no painel da série no ATX TV Festival, em Austin

 

 

Uma das maiores e mais complexas discussões nos EUA, atualmente, é a lei que regulamenta o aborto (no estado na Georgia a lei foi suspensa e o aborto, que era permitido, foi proibido), vocês pretendem abordar esse assunto no seriado?

Joanna: Sim, com certeza. Até porque é um problema que está mais relacionado com a saúde das mulheres do que, necessariamente, com o direito de escolha. Ver as mulheres perderem a sua voz e seu poder de decisão sobre seu próprio corpo, por conta de leis criadas em sua maioria por homens brancos e privilegiados, é muito amedrontador. Por isso, nós vamos sim falar desse assunto na série.

A maioria das temporadas de “The Fosters” foi ao ar durante o governo Obama, em um tempo de avanços e mudanças positivas, um tempo de esperança. A gente sabe que sociedade retrocedeu nos últimos anos. Até que ponto a administração atual influencia nas estórias que vocês decidem abordar na série?

Joanna: “Realmente, quando estávamos rodando o último episódio da primeira temporada de “The Fosters”, o casamento entre pessoas do mesmo sexo foi regulamentado nos EUA e, com isso, as mães se casaram oficialmente na série. Hoje em dia, com tudo que anda acontecendo, nosso principal foco não é criar estórias felizes, mas estórias que tragam esperança. Por exemplo, se eu puder fazer qualquer coisa para convencer aos jovens sobre a importância do voto, eu vou fazer. Se você é jovem, não pense que o seu voto não importa, pelo contrário, hoje, mais que nunca, cada voto faz a diferença. E esse é um assunto que nós vamos abordar, especialmente porque a segunda temporada vai ao ar ano que vem, pré-eleição nos EUA e, com certeza, nós vamos fazer uma campanha de incentivo para que os fãs de nosso seriado saibam da importância crucial de seu voto, pois não votar pode trazer consequências graves, agora mais do que nunca”.

Joanna ainda complementa dizendo que sabe o que está acontecendo no Brasil, que elegeu um presidente que, como Trump, prega o racismo e o preconceito. Ela diz que lamenta e que tem a consciência dos problemas causados por esse tipo de liderança. E complementa dizendo saber que os EUA, de certa forma, funcionam como uma espécie de modelo para outros países. Por isso, a eleição aqui é tão crucial no ano que vem.

Falando sobre isso, sabemos que nessa temporada a personagem Jasmine, que é transgênero, vai ter uma festa de 15 anos com toda a pompa da ocasião. Como surgiu essa ideia?

Joanna: Na verdade, veio de um documentário que assisti sobre festas de 15 anos, uma tradição no México (e no Brasil também, comentei com Joanna). Neste documentário, uma das meninas é transgênero. Achamos super bonito, e resolvemos fazer um episódio com essa temática, porque a Jasmine, apesar de ter 20 e pouco anos, nunca teve a chance de comemorar seu aniversário na adolescência como gostaria, assim como a maioria das meninas trans. Então achamos que seria uma bela homenagem e uma inspiração para o público também. Além disso, depois que o atual presidente baniu os transgêneros do exército, com a desculpa que os medicamentos que eles usam para a transição ser muito caro para o governo (o que não é real, pois uma cirurgia de joelho de um soldado custa muita mais que os medicamentos usados pelos trans), nós achamos que seria importante prestar uma homenagem para essa classe que sofre tanta discriminação”.

 

Joanna Johnson com os criadores da série “The Fosters”, Brad Bredeweg e Peter Paige

 

O que eu gosto na série é que não só as protagonistas têm um papel importante, mas todo o resto do elenco tem as suas trajetórias super bem desenvolvidas. Temos a chance de conhecer a fundo cada um deles. Vocês pretendem dar continuidade a essa estrutura?

Joanna: Sim, com certeza. Aliás, é uma coisa que a Maia e a Cierra  sempre quiseram fazer, elas amam esse elenco e o objetivo delas sempre foi que todos os atores brilhassem e que a estória de cada personagem fosse contada em detalhes. Por isso, vocês vão ver que terão episódios em que a Mariana e a Callie vão aparecer menos, pois serão focados em um dos outros personagens. É a nossa intenção mesmo, mostrar a vida de cada um, suas famílias e descobrir mais sobre suas personalidades, quem eles são de verdade.

E assim nosso tempo com Joanna acabou, nos deixando ainda mais curiosos para acompanhar “Good Trouble”. Mas o auge do nosso papo com Joanna foi ver como ela é de fato uma pessoa que se interessa por estórias que ensinam e transformam a sociedade. Essas são as pessoas essenciais no entretenimento, aquelas que não estão só preocupadas com a fama e o glamour da profissão, mas que usam sua voz e seu poder para educar as milhares de pessoas pelo mundo afora que assistem o resultado do seu trabalho na TV. Sou fã de carteirinha de Joanna, assim como sou de “The Fosters” e “Good Trouble”.

Veja o que rolou no painel de Good Trouble no ATX TV Festival:

 

https://www.hollywoodeaqui.com/good-trouble-painel-no-atx-tv-festival-apresenta-a-2a-temporada-do-spinoff-de-the-fosters/

 

Confira já a nossa entrevista com Maia Mitchell e Cierra Ramirez, as estrelas de “Good Trouble”:

https://www.hollywoodeaqui.com/entrevista-com-maia-mitchell-e-cierra-ramirez-as-estrelas-de-good-trouble/

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