Dia 4 de Julho: Tempo de repensar e celebrar o verdadeiro povo americano em uma viagem por Massachusetts

Esse ano eu planejei passar o celebrado feriado de 04 de julho, Dia da Independência dos EUA, fazendo uma viagem de carro pela Nova Inglaterra, região que fica do lado leste dos EUA, próxima a Nova York e que faz fronteira com o Canadá. Nessa aventura passei pelos estados de Connecticut, New Hampshire, Massachusetts e Maine (já estive em Rhode Island e Vermont vai ficar para o Thanksgiving porque tem muita coisa que quero ver por lá, preciso de mais tempo).

Antes de tudo, bom relembrar aqui que muitos séculos antes da região ser invadida pelos colonizadores britânicos, o povo indígena Wampanoag habitava o local.

O maior impacto dos efeitos terríveis da colonização sentimos durante a nossa visita a Massachusetts, um dos estados que é parte das treze colônias onde nasceu os Estados Unidos.

Motivada a explorar a herança que os indígenas nos deixaram, a amiga que estava viajando comigo fez uma pesquisa e identificou duas pedras que tinham sido marcos importantes para o povo Wampanoag. Saímos de carro rumo a área onde as pedras com inscrições históricas estariam expostas. De acordo com o mapa, uma pedra estava em um parque em Lakeville – Betty’s Neck, e a outra em um pequeno museu, numa cidadezinha próxima.

A viagem é pra lá de pitoresca. As cidadezinhas, que são vilarejos cercados de florestas, lagos e do mar, parecem cenários de filme. Não é à toa que muitas produções cinematográficas são rodadas em Massachusetts. A locação é realmente perfeita. Importante destacar que é uma área com casas lindíssimas, classe média alta.

Quando chegamos em Betty’s Neck, visitamos o lago e fomos procurar a primeira relíquia que os Wampanoag nos deixaram de herança. Pra nossa tristeza, não conseguíramos chegar no local de carro e teríamos que fazer uma longa caminhada. O acesso era super difícil, por sinal. Infelizmente, não tínhamos tempo e acabamos abrindo mão da vista.

Quando colocamos o endereço pra seguirmos para o museu, em uma cidadezinha próxima, onde está a segunda relíquia, para a nossa incredulidade, vimos que o estabelecimento estava fechado. Em pleno feriado de 4 de Julho, pra nós, não fazia o menor sentido um museu estar fechado, ainda mais considerando que aquela é uma região turística.

Enfim, tivemos que nos conformar e partimos pra Plymouth, cidade de Massachusetts, que ocupa um lugar de grande destaque na história, folclore e cultura americana e é conhecida como “a cidade natal da América”, pois foi o local onde os Peregrinos chegaram (da Inglaterra) no navio do Mayflower, em 1620, e onde a Nova Inglaterra foi estabelecida pela primeira vez. Plymouth é o município mais antigo da Nova Inglaterra e um dos mais antigos dos Estados Unidos.

Bom destacar que a localização de Plymouth, quando os colonizadores chegaram, era uma vila da tribo Wampanoag chamada Patuxet.

Para a nossa revolta e, infelizmente, zero surpresa, ao contrário das pedras que representam o povo indígena, a super famosa pedra que simboliza os peregrinos, ou seja as famílias inglesas de cidadãos brancos, que colonizaram os EUA, não só está em um mini templo construído para homenagear os colonizadores, no coração de Plymouth, como tem estátuas dos peregrinos e uma réplica do tal navio Mayflower (que nos recusamos a visitar) que os trouxe para o “novo mundo”.

 

 

Mayflower

Agora vocês vejam a diferença como esse país trata os peregrinos britânicos e os povos indígenas que, por sinal, eram os donos da terra e estavam aqui muitos séculos antes da chegada dos colonizadores.

Pra achar um marco histórico dos Wampanoag é impossível, enquanto os brancos tem um “altar”; essa é uma estratégia comumente usada para apagar os nativos da história dos EUA. Vergonhoso.

Registrei tudo durante o passeio para compartilhar a experiência e contar a história que veio antes da história aqui. Pois assim tiramos a venda dos nossos próprios olhos e passamos a questionar as informações que recebemos. E essa é uma estratégia também que contribui pra nossa evolução.

Plymouth é uma cidade de veraneio pitoresca, tem vários bares, restaurantes e lojinhas. Curtimos o chopp, saboreamos deliciosos frutos do mar e passamos a noite em um confortável hotel no centro. Fomos tratadas decentemente, mas éramos duas forasteiras, latinas (minha amiga é mexicana/estadunidense e eu, brasileira), com cabelos enrolados, escuras, e a cor da nossa pele se destacava no mar branco de todos os estabelecimentos que entramos.

Galeria Plymouth

Até os turistas são brancos, sinceramente, não cruzamos com pretos, latinos, muçulmanos em nenhum momento da nossa passagem pelo local. Até os jovens que trabalhavam nos restaurantes eram brancos, filhos de pais privilegiados que estavam trabalhando no verão, como vemos nos filmes.

Durante muitos anos, eu admirei o amor dos estadunidenses pela sua pátria, achava interessante as bandeiras na porta das casas e a forma fervorosa com que eles comemoravam o dia da independência de seu país. Ao longo dos anos, fui estudando, aprendendo, viajando e percebendo que essa obsessão deles pelo país não era saudável. Tanto não é que elegeram o Trump, destruíram o Capitólio… Enfim, ainda é uma das datas mais celebradas pelo povo, com churrasco, fogos de artifício e o figurino com as cores da bandeira, mas, hoje em dia, eu dou muito mais valor ao feriado de Juneteenth, que comemora a abolição da escravatura nos EUA, no dia 19 de junho, também chamado o Dia da Liberdade, do que ao 4 de Julho. Impressionante que a data só passou a ser lembrada e o feriado nacional só foi declarado em 2021, já no governo Biden.

 

Um absurdo terem levado tanto tempo para reconhecerem uma data tão importante, ainda não festejada pela maioria com a consciência que merece. De qualquer forma, antes tarde do que nunca. Eu também levei anos para “desglamourizar” os Estados Unidos e a cultura estadunidense. Mas, nada como dar o primeiro passo, passamos a enxergar a história de outra forma. Por isso, aqui escrevo a minha experiência, quem sabe sirva como um primeiro passo para você enxergar a sua própria história.

 

Fonte: https://en.m.wikipedia.org/wiki/Plymouth,_Massachusetts

 

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