“Não deixe para reconhecer um bom momento só depois que ele virar uma lembrança. A vida é hoje, a vida é agora. Viva.” – Nanda em “Os Dias Eram Assim”
Hoje faz 12 anos que mudei para os Estados Unidos. Eu estava revendo o último capítulo da série “Os Dias Eram Assim” quando ouvi essa frase que Nanda (Júlia Dalavia) escreveu na carta que deixou para sua mãe, que não só resume bem a minha jornada na terra estrangeira, como a minha filosofia de vida.
Eu sempre vivi o presente. Juro que tento fazer bonito e aprender com os erros e repetir os acertos do passado. Ás vezes consigo, muitas vezes falho miseravelmente, mas, independente de tudo, eu sigo meus instintos.
Foi assim que vim parar nos EUA, no dia 3 de setembro de 2009. Quando deixei o Brasil, fui criticada por muitos; o país, governado por Lula, vivia seus dias de glória e prometia ter um futuro brilhante. Mas preferi aproveitar a oportunidade do presente. O dólar, a R$ 1,50, era perfeito para começar a vida em Los Angeles, especialmente porque naqueles tempos os Estados Unidos passavam por uma de suas maiores crises econômicas e os estadunidenses precisavam mais que nunca do dinheiro gringo pra segurar a economia de seu país.
Assim, fui ficando. Infelizmente, os papéis se inverteram ao longo dos anos. O dólar explodiu, as crises política e financeira se instalaram no Brasil e, pra piorar, um presidente genocida foi eleito pelo povo. Nos EUA também tivemos dias de chumbo durante a “Trumplândia”. Mas a economia do país estava forte até ser abatida pelo coronavírus ano passado.
A pandemia abalou o mundo, mas, sinceramente, só reafirmou a frase de Nanda e a minha filosofia de vida. O presente é a única realidade de que temos certeza.
Talvez, por isso, essa tragédia mundial tenha me incentivado a continuar dando asas a minha alma cigana. Desde de abril de 2019, quando saí do apartamento onde morei por 8 anos em Beverly Hills, eu passei uma temporada em Austin, Texas (encurtada pela pandemia, pois o projeto em que eu trabalhava foi cancelado), uma temporada com meus pais no Rio, uma temporada morando no Brooklyn, em NY, até retornar a Los Angeles, onde estou agora.
Engraçado que, depois de rodar tanto, escrevo esse post na sala do meu antigo apartamento, na Burton Way. Uma amiga mudou pra cá quando eu saí há 2 anos. Generosamente, ela me cedeu seu lar enquanto está no Brasil.
Mas esse não foi o único anjo que encontrei na cidade que leva seu nome. No dia que retornei a LA, em maio deste ano, eu entrei em um Uber por engano no aeroporto e deixei a minha mochila com 2 computadores da Apple, a Apple TV, e o firestick da Amazon (mais de dois mil dólares em equipamentos eletrônicos) no banco de trás do carro. Como não era o Uber que eu tinha chamado, a empresa – nada solícita – disse que não podia fazer nada pra me ajudar. Sem grana para substituir os itens perdidos, me restou entregar pra Deus e mergulhar no trabalho usando apenas o celular.
Fazia 2 semanas que estava de volta, quando a amiga com quem eu dividia apartamento em NY disse que eu tinha recebido uma carta escrita à mão, com remetente de LA. Eu não conhecia a pessoa e pedi para ela abrir. Era uma carta escrita pelo motorista do Uber que entrei por engano pedindo para eu confirmar os itens que estavam na mochila que eu tinha deixado em seu carro. Quase tive um troço, não acreditei, respondi, trocamos contato e peguei com ele a mochila alguns dias depois. Quando o encontrei, ele disse que tentou entrar em contato comigo pelo Uber, em vão, e pediu desculpas por ter mexido na mochila pois ele estava tentando achar uma forma de entrar em contato comigo. Por sorte (ou destino) lá dentro estava uma cópia da minha declaração de Imposto de Renda com meu endereço de Nova York, e com isso ele conseguiu me localizar.
Eu vou contar essa história pro resto da minha vida. Em tempos em que convivemos com tanta maldade, tantos golpes, tanto bullying no mundo real e nas redes sociais, pessoas honestas merecem destaque. Eu nunca vou esquecer o rosto do rapaz e sua atitude vai aquecer pra sempre meu coração (inclusive hoje escrevo essa matéria do laptop que recuperei graças a essa alma de luz).
Mas minha coleção de anjos anda a todo o vapor, não posso deixar de mencionar meus vários amigos queridos que estão abrindo a porta de suas casas pra me receber com tanto amor em LA. Sei que é clichê a gente dizer que amigos são a família que a gente escolhe, mas falo sem medo de cair no lugar comum que escolhi as pessoas certas na terra estrangeira. A relação que construímos com as pessoas quando moramos no exterior é uma relação única, até porque tem experiências que só a gente consegue compartilhar na sua essência. Eu só agradeço a todos que dividem comigo as dores e as delícias do meu dia a dia aqui há 12 anos.
E nesse “LAversary”, algumas pessoas me perguntam “você vai ficar em LA de vez agora?”. E a minha resposta é simples, “não sei”. Mas seja lá por quanto tempo for, eu vou aproveitar essa cidade grande, com alma de cidade do interior, onde o pôr-do-sol tira o fôlego e o tempo parece passar mais devagar, onde tenho meus anjos e encontrei muita paz.
Como sempre digo, Nova York é a minha paixão e no meu mundo ideal eu moraria eternamente entre o faroeste e a “Big Apple”, com direito a férias prolongadas no Rio e em SP. Mas esse desejo pertence ao futuro e, por enquanto, meu foco está no presente na Califórnia, com uma escapada a NY de vez em quando.
Sempre que celebro mais um ano nos EUA, eu faço uma reflexão e imagino como eu seria uma pessoa muito diferente e infeliz se tivesse cedido às críticas que recebi ao sair do Brasil e tivesse decidido ficar lá. Assim como eu seria infeliz se tivesse planejado nos mínimos detalhes esses últimos 12 anos. Tudo foi completamente diferente do que eu imaginei. Às vezes muito melhor, outras muito mais desafiador. Tive dias muito tensos, difíceis e outros em que a realidade foi mil vezes melhor que o sonho.
Mas acho que, na verdade, o saldo só é positivo porque eu aproveitei cada segundo como se fosse o último e pretendo continuar a dar valor para a felicidade quando ela está acontecendo porque a gente sabe que ela não vai durar pra sempre.
Então procuro valorizar cada encontro com esse sentimento tão singular, por isso compartilho com vocês os registros de momentos mágicos e lugares incríveis que visitei nesse último ano, em NY e em LA. Essas fotos alimentam a minha poupança emocional, onde está meu conforto nos dias tristes, em que o coração aperta. Fui privilegiada ao passar boa parte do ano nos EUA, quando os números de casos do COVID estavam mais controlados aqui.
Em 12 anos, renasci várias vezes, me reinventei, caí, levantei, mas, no último ano, poder exercer a minha liberdade (tomando todas as precauções necessárias de proteção contra o vírus) foi o maior benefício da minha trajetória no exterior, cercada por anjos generosos e honestos, em duas cidades que chamo de lar.
O que mais celebro hoje é ter a capacidade de saber reconhecer um bom momento, antes que ele vire uma lembrança. Espero que no presente eu encontre força e inspiração para pular os obstáculos e continuar a caminhada em direção a realização dos meus sonhos, porque, verdade seja dita, eu já tenho uma vida melhor do que imaginei.